domingo, fevereiro 25, 2007

SMS

"Que é que fazes hoje à noite? queres ir ao cinema?". Uma SMS no telemóvel e um nome recuperado da memória, juntamente com um par de olhos verdes que achava que nunca conseguiria esquecer. Nos sonhos era assim, desde menina: olhos verdes, cabelos pretos, um sorriso lindo de morrer e uma paixão assolapada que havia de durar o resto da vida. Os olhos eram verdes, mas o cabelo era loiro e o sorriso às vezes era longe, como se só o corpo estivesse ali e o cérebro andasse noutro sítio qualquer. Devia ter desconfiado logo de início que a coisa não batia certa com o sonho, mas a paixão assolapada não deixou e a descoberta só a fez meses depois, quando a porta lá de casa se fechou e os olhos verdes, um bocadinho aguados com umas belas lágrimas de crocodilo, desapareceram de cena.
Voltaram hoje, atrelados a uma SMS no ecrã do telemóvel, e, surpreendentemente, não fizeram mossa. Nada. Zero. Também não lhe tremeu a mão quando marcou o número e lhe ligou de volta, que aquilo merecia mais do que uma mensagem escrita.

Estou bem, claro, e tu, também? que tens feito, nestes anos todos? ainda bem. O quê? És pai? meu Deus! nunca imaginei!! E também te rendeste ao casamento, que sempre juraste que não era para ti? É pena... As desilusões são sempre muito tristes. As perdas também. Mas um divórcio não é o fim do mundo, não é? Claro que te sentes sozinho, é normal, mas qualquer dia isso passa. Bem sei que pareço a minha mãe, mas o que mais interessa é ter saúde. Ups! Não imaginava, desculpa... E quando serás operado? Vai correr bem, tenho a certeza. Não desanimes. E qualquer coisa liga-me, está bem? Tenho pena, mas não posso mesmo ir ao cinema contigo. Fica para outro dia. Vai dando notícias, está bem?

Não tremeu quando desligou o telefone, mas passou os dias seguintes a pensar no homem dos olhos verdes que costumava ter uma agenda cheia de telefones de miúdas, que não passava uma noite sozinho, que queria ser rico e feliz e que agora estava divorciado, com um filho que só via ao fim de semana e uma operação ao coração daí a um mês e meio. A vida tem esta mania de nos contrariar os planos e de nos apresentar a factura quando menos a esperamos...